Sergipe 205 anos de emancipação: a luta por autonomia que moldou a identidade do estado
Em 8 de julho de 1820, há exatos 205 anos, o então território de Sergipe alcançou a tão almejada emancipação política do Estado da Bahia. A data foi oficializada pela Carta Régia do rei Dom João VI, reconhecendo a autonomia administrativa de Sergipe e elevando-o à condição de capitania independente.
A conquista foi fruto de anos de insatisfação e articulação por parte da elite sergipana, que buscava liberdade para gerir seus próprios recursos e interesses, além de consolidar uma identidade política e cultural própria.
A subordinação histórica à Bahia
Inicialmente uma capitania criada em 1590, Sergipe permaneceu durante séculos sob o domínio administrativo da Bahia. Apesar da relevância econômica — com produção expressiva de açúcar, algodão e pecuária — a região era limitada em suas decisões políticas e financeiras.
Esse cenário de subordinação gerava ressentimentos entre os habitantes locais, que começavam a se organizar em torno da ideia de autonomia. O crescimento populacional e econômico de Sergipe, entre o fim do século XVIII e o início do XIX, impulsionou ainda mais esse desejo de independência.
Movimento emancipacionista: o clamor por liberdade
Influenciados pelos ideais iluministas e pelas lutas por independência que ganhavam força em várias partes do mundo, os líderes sergipanos passaram a pressionar a Coroa Portuguesa por maior autonomia. As discussões se intensificaram no contexto das transformações políticas que agitavam o Império Luso-Brasileiro.
Em resposta às pressões e ao cenário político da época, o rei Dom João VI assinou, em 8 de julho de 1820, a Carta Régia que elevava Sergipe à condição de capitania independente. A partir daí, o território passou a ter governo próprio, arrecadar seus tributos e tomar decisões voltadas aos seus interesses econômicos e sociais.
A voz da história: identidade e cultura pós-emancipação
Para a historiadora e professora emérita da Universidade Federal de Sergipe, Terezinha Alves de Oliva, a emancipação de Sergipe foi um divisor de águas na história local.
“Havia um comportamento dos habitantes de Sergipe, que era uma capitania que não se conformava com a dominação da Bahia. A emancipação é exatamente este corte da subordinação em relação à Bahia. Ela representa o começo da nossa história como unidade política. A partir da emancipação, Sergipe passa a ter uma identidade política, um governo próprio, pode cobrar tributos e vai tomar conta dos interesses da sua economia e que se constitui com uma cultura própria”, ressalta Terezinha.
Além dos impactos administrativos, a separação contribuiu diretamente para a construção de uma cultura própria, com valores, símbolos e tradições que ainda hoje são celebrados pelos sergipanos.
Memória e comemoração: O papel da história na construção do presente
A valorização dessa memória, no entanto, ainda enfrenta desafios. Para a professora Terezinha, a história da emancipação política de Sergipe ainda é pouco conhecida entre os próprios sergipanos, o que fragiliza o senso de pertencimento coletivo.
“Nossa cultura tem aspectos bem próprios, originais, tudo isso constitui a nossa identidade. Por isso, é tão importante comemorar esta data. Ela lembra a comunidade sergipana que somos uma unidade, e que isso foi conseguido com muito esforço, com sacrifício dos nossos antepassados e que lembrar isso é importante para a sociedade hoje”, explica.
O álbum de Sergipe: um registro de um século de história
Um dos registros mais simbólicos do centenário da emancipação é o “Álbum de Sergipe 1920”, de Clodomir Silva. A obra reúne imagens das cidades, da vegetação e das atividades econômicas do estado cem anos após sua emancipação.
“Ele pretende ser um resumo do que seria a vida sergipana um século depois da emancipação, com fotos das cidades, das atividades econômicas, da vegetação. É uma fonte de estudos muito importante. O IHSE mandou reimprimir, em 2020, no centenário da emancipação, o álbum para lembrar esse importante documento do primeiro século da nossa história”, destaca a historiadora.
Esquecimento e símbolos: O chamado ao resgate da memória sergipana
Mesmo com documentos e datas emblemáticas, o desconhecimento sobre o processo de independência de Sergipe ainda persiste entre a população.
“A falta de conhecimento do processo da independência de Sergipe faz com que as pessoas não tenham muita memória da nossa emancipação política. O hino sergipano, por exemplo, é o mais antigo símbolo da memória sergipana e pouca gente canta. E ele fala da emancipação o tempo todo. Ele chama o sergipano para festejar o dia brilhante, o dia 8 de julho de 1820. E por que é um dia brilhante? Porque trouxe o sol da liberdade, da independência pra Sergipe”, lamenta Terezinha.
8 de julho é mais que uma data – É patrimônio coletivo
A comemoração dos 205 anos de emancipação de Sergipe vai além de relembrar um decreto real. Trata-se de reafirmar a luta de um povo por sua autonomia, cultura e identidade própria — valores que ainda hoje moldam a sociedade sergipana. E como lembra a professora Terezinha, manter viva essa história é essencial para fortalecer o sentimento de pertencimento de uma nova geração.